18 de novembro de 2011

Rios voadores

Rios voadores são cursos de água atmosféricos, invisíveis, que passam em cima das nossas cabeças transportando umidade e vapor de água da bacia Amazônica para outras regiões do Brasil. 

A floresta amazônica funciona como uma bomba d'água. Ela puxa para dentro do continente umidade evaporada do oceano Atlântico que, ao seguir terra adentro, cai como chuva sobre a floresta. Pela ação da evapotranspiração da floresta esquentada pelo sol tropical, as árvores devolvem a água da chuva para a atmosfera na forma de vapor de água, que volta a cair novamente como chuva mais adiante.


Pequenas nuvens que surgiram como resultado da evapotranspiração da floresta amazônica, em torno do Rio Juruá, AM. Foto Gérard Moss

Projetadas em direçao ao oeste pelos ventos alísios, as massas de ar carregadas de umidade (boa parte dela proveniente da evapotranspiração da floresta) encontram a barreira natural formada pela Cordilheira dos Andes. Isso faz com elas se precipitem parcialmente nas encostas leste da cadeia de montanhas, formando as cabeceiras dos rios amazônicos.

Contudo, barradas por esse paredão de 4.000 metros, as correntes aéreas (ou rios voadores), ainda carregadas de vapor d’água, fazem a curva e partem em direção ao sul, para as regiões do Centro-Oeste, Sudeste e Sul do Brasil e os países vizinhos. É assim que o regime de chuva e o clima do Brasil se deve muito a um acidente geográfico localizado fora do país.


A quantidade de vapor de água transportada pelos rios voadores é imensa, podendo ter a mesma ordem de grandeza, ou mais, que a vazão do rio Amazonas (200.000 m3/s), tudo isso graças aos serviços prestados da floresta. 
Estudos do INPA já mostraram que uma árvore com copa de 10 metros de diâmetro é capaz de bombear para a atmosfera mais de 300 litros de água, em forma de vapor, em um único dia - ou seja, mais que o dobro da água que um brasileiro usa diariamente. Estima-se que haja 600 bilhões de árvores na Amazônia: imagine então quanta água a floresta toda está bombeando a cada 24 horas.

É possível ver a olho nu o processo de reciclagem da umidade. Pouquíssimo tempo depois da passagem da chuva, a floresta começa a lançar a umidade de volta para a atmosfera. Foto Margi Moss.

O Projeto Rios Voadores pesquisa, por meio da análise de amostras de vapor de água coletadas em um pequeno monomotor, as massas de ar que provêm da Amazônia trazendo umidade para outras regiões do Brasil. Essas massas de ar são conhecidas hoje como rios voadores.
Na tentativa de identificar a origem do vapor de água transportado pelas massas de ar vindos da Amazônia e quantificar o papel da evapotranspiração da floresta amazônica nas chuvas que caem nas regiões mais ao sul, Gérard Moss e o professor Eneas Salati, idealizaram o Projeto Rios Voadores.

Na primeira fase do projeto, realizada entre 2007-2009, foram coletadas 500 amostras de vapor de água de várias regiões do Brasil, principalmente da Amazônia. Estas amostras foram analisadas pelo Centro de Energia Nuclear na Agricultura da USP.

Na segunda fase, os pesquisares irão interligar os resultados das análises com as condições meteorológicas regentes na hora da coleta. Por meio de parceria com prefeituras de algumas cidades no país, eles pretendem também inserir uma aula sobre os rios voadores nas escolas municipais da rede pública, com oficinas de treinamento dos professores e fornecimento de material didático.

Wedis Martins